segunda-feira, 16 de março de 2009

Jesus, Mistério Divino, Reconciliando a Realidade de Deus e a Realidade dos Homens

“Deus estava em Cristo, reconciliando consigo o mundo...” II Cor. 5:19

Um professor meu, seguindo Paul Tillich, costumava afirmar que a palavra “Deus” é um termo que nomeia a fonte misteriosa daquilo que tem significado último.” Dizer “Deus” é expressar numa palavra aquilo que em última instância nos satisfaz, aquilo que em última instância nos realiza, a fonte de poder que torna possível a justiça e o amor, que dá esperança e significado às nossas existências. Nas palavras do próprio Paul Tillich, Deus é o nome da infinita e inesgotável fundação do próprio ser.

Interessante notarmos que grupos como os AA, ou os Narcóticos Anônimos (NA) se referem a Deus simplesmente como a um poder superior. Estimulam os seus membros a invocar um poder maior, que pode ajudá-los a se libertarem de outros poderes que os mantêm dependentes e lhes provocam sofrimento e opressão. Essa, na verdade, é a única maneira legítima de nos referirmos a Deus. Deus está para além da nossa razão e da nossa compreensão. Toda tentativa de compreender Deus em sua totalidade constitui idolatria, porque reduz Aquele que é infinito aos limites da razão finita, das nossas confissões doutrinárias finitas.

É interessante notarmos que, na Antiguidade, a palavra “Deus” sugeria mistério e levava as pessoas à contemplação e à reverência. Os judeus, mesmo tendo um nome para Deus, não o pronunciavam, por reverência Àquele que é maior do que qualquer palavra humana. No AT encontramos várias vezes a expressão de maravilha e reverência diante do Divino: “Mas fiz calar a minha alma, tal criança desmamada para com sua mãe, tal é minha alma para comigo.” (Salmos 131:2) “O Senhor está no seu santo templo. Cale-se diante dEle, toda a terra.” (Hab. 2:20) “Cale-se diante do Senhor toda a carne.” (Zac. 2:13). No Apocalipse, por ocasião da abertura do sétimo selo, há espanto e maravilha de tal forma que se faz silêncio por meia hora no céu.” (Ap. 8:2)

Era com essa noção da divindade que se construíram os templos no passado. Os templos eram locais de contemplação do divino. Aquilo que não se conseguia expressar por meio de palavras tentava-se expressar através da arte, de tal forma que quem adentrasse aquele lugar fosse levado a contemplar aquilo que transcende toda razão humana e toda palavra. Os Quackers levaram isso tão a sério que instituíram o silêncio, e não a palavra, como parte central do culto. Nos dias atuais, somos impulsionados a falar em todo o tempo. Nossa adoração hoje se reduziu a palavras, às vezes frases repetitivas e vazias, verdadeiros mantras evangélicos que repetimos em nossos cultos. Perdemos o senso de maravilha, de contemplação do divino.

Contemplar o divino nos leva a reconhecer a nossa humanidade, a enxergar os nossos limites, e a nos ver dentro desta dimensão maior, desta dimensão sagrada, da vida em si, que nos contém e dentro da qual nos movemos. Pecado é o distanciamento desta realidade, que nos isola de Deus, e conseqüentemente uns dos outros. A perda dessa dimensão do divino nos coloca em grande perigo de cairmos na idolatria. Cada vez que abrimos a boca e falamos “Deus”, corremos grande perigo de pecarmos por idolatria. Isso porque tendemos a reduzir Deus a fórmulas prontas, que, conscientemente ou não, carregamos dentro de nós, definindo e limitando Deus, pretendendo conhecer a vontade de Deus, os desígnios de Deus, a salvação de Deus etc. O interessante é que Deus, mesmo ao se mover em busca do ser humano, não o fez falando, mas o fez através de um outro mistério. “E o verbo se fez carne, e habitou em nós, cheio de Graça, e vimos a sua glória.” (João 1) Através do mistério do Deus encarnado, a realidade divina e a realidade humana se reconciliam.

Pr. Raimundo César
Igreja Batista da Esperança - Salvador - BA

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